1 de fev. de 2010

Hoje estou espartana - desabafo de uma bailarina balzaquiana

Oi! Estou superfeliz de estar começando a me comunicar mais e com mentes pensantes da dança no Brasil. Aqui no sul já tenho um grupo de amigas de altíssimo nível, daqueles assim, que se a gente senta pra falar tem que ter tempo, muito tempo! Uma das coisas mais legais que já aconteceram este ano foi conhecer Viviane Amaral, para desespero dos maridos ansiosos em ver suas esposas em casa em horário digno, hehe! Digo isto por que não há meios de chegar em casa cedo quando juntamos na mesma roda: Fernanda Zahira Razi, Samara Leonel, eu e agora Vivi, cheia de conversa nova e "bôua", nos lugares mais apetitosos da Portinho. Falando nisso, Sami, meu corpo precisa daquele sorvete de torta de maçã denovo. Ahhhh, Cronk's! E vamos levar Vivi para tomar O suco de abacate com laranja da Lancheria do parque!
Voltando ao artigo proposto, tenho lido o blog Andanças de Lory, muito legal e traz boas polêmicas! Um dos últimos posts fala sobre bailarina e público, ela citou um esquema que rola com o pessoal do teatro: de educar a platéia. Para não rolar mais frieza, histeria, palma na hora errada, gente levantando da cadeira no meio do show...entre outras atrocidades que acontecem com qualquer artista de palco. Povo brasileiro! Só respeita a novela das oito, né? Só vai no banheiro na hora do intervalo e olha lá!
Então, já houveram algumas respostas alternativas, entre elas a minha, de Vivi, de Lucy (outra cabeça mui pensante!), etc. Enquanto essa tal educação não acontece de fato, convido-as a reavaliar nossos papéis nesse trem.
Primeiro: se o povo é mal educado, loucas somos nós que tentamos apresentar uma arte estrangeira e sensível para um povo que só ouve em sua maioria, música de baixíssima qualidade (não quero citar para não ferir possíveis almas delicadas).
Segundo: loucas somos nós, que tentamos fazer com que as pessoas batam palmas para um tipo de interpretação e cultura musical que nada mais nada menos influenciou Mozart. Por acaso quem ouve o funk já ouviu falar em allegro? Valha-me Deus.
Terceiro: loucas somos nós, mas persistentes o bastante para lutarmos com nossas pequenas armas (dança, conhecimento e um toque de rebeldia) contra a massificação da ignorância, em sua continuidade. Pois com o pouco que sabemos dá pra ser bem mais feliz.
Quarto: como cabeças pensantes temos que dar bons exemplos. Eu ainda me considero um pouco infeliz nesse aspecto, pois sou um pouco encrenqueira, mas não desistirei e um dia vou alcançar o nível da Fê. A Fê é minha colega do Masala. Ela é imparcial em seu equilíbrio emocional. É uma lady. Daiane, aprenda logo por favor! É bem aquele lance do fale menos e faça melhor.
Os bons exemplos aos quais me refiro e que contribuem para educação de platéia é em relação aos shows, sua divulgação, seu papel, sua justificativa e abordagem. Ok, por partes:
Algumas pessoas quando realizam shows estão tão preocupadas em pagar o trivial, que banalizam o próprio trabalho e o das outras. Não dão devida atenção para layouts de bom gosto, acham que o que importa é o contexto. Que contexto? Aquele que inventaram pra poder dançar? Aquela intenção velada, disfarçada de grande coisa que acabam por relacionar com a dança do ventre? Isso é enfadonho e triste pra mim. Tem gente que pergunta: ai, Dai, porque não produz um show? Minha resposta é: o dia que eu tiver kooh para pagar decentemente O ELENCO e todo o resto, eu farei, do contrário, não preciso de palco nem de investimento de outrens para aparecer de qualquer jeito. Fora isso, gente, não é show profissional. É informal. Não façam os amigos e parentes de vocês pagarem por isso. Se o show é feito com amor, é simples, tem uma intenção verdadeira, compartilhe. Mas não faça público e bailarina pagar pra estar ali. Quem produz tem que meter isso na cabeça. Os shows de dança do ventre nunca serão bem vistos enquanto esta palhaçada não acabar. E parem de linkar dança do ventre com um monte de aspectos lúdicos, isso já era. Isso é pra vender. Se é verdade mesmo, quem fizer dança ou quem assistir o show vai sentir e determinar a veracidade daquilo que viu. Por mais terapêutica que a dança seja! Todas as formas de atividade física saudável são terapêuticas, hidroginástica é terapeutica, massagem é terapêutica. Como é que o flamenco nunca se vendeu como terapia? Uma coisa é certa, a dança vai ser e sempre será uma forma de curtição, de autoconhecimento, de bem estar e qualidade de vida, direcionada para a mulher mais do que as outras danças, mas isso não justifica qualquer apelação neste sentido. O consultório ainda é uma ótima solução para resolver frustrações.
Eu já fiz tanta meleca, já embarquei em tanta canoa furada, que me dou direito de falar destas coisas, pois eu sei quando as intenções são reais. O trabalho da Karina é um caso à parte, não tem nem comparação. Meu trabalho forte surgiu com ela, fundamentou toda minha base. Mas o que surgiu de "coisas" se utilizando deste meio sem sequer compreender o propósito de tudo, nos faz ter o triplo do cuidado ao relacionarmos dança com misticismo e feminino. E chega de quatro elementos! Valha-me Deus 2!
Por último, meninas, se vocês concordarem eu acho superimportante começarmos a mostrar que bailarina tem língua. Pra falar! Vamos nos intrometer mais em palestras, agarrar os microfones e informar sobre aquilo que o povo vai ver. Também é um meio ativo, direto e eficiente de educar a platéia. Quando realizarem shows, dêem atenção para tudo, verifiquem a qualidade do que estão realizando. Imprimam um roteiro com as danças e as devidas explicações e "regras" do show pra distribuir na entrada, comuniquem-se com o público de vocês, valorizem a presença dele, não esperem que a dança faça tudo isso por vocês, pois não é assim que funciona neste país, vamos tentar compreender a razão que os faz assistir nosso show. Eu e as meninas do grupo estamos sempre discutindo isto, por que as pessoas iriam nos ver, como fazer para que eles queiram isso em vez de ficar em casa vendo a novela? Questionem-se em favor da própria qualidade e em respeito a eles. O retorno é indiscutível.
Bom, eu dou a outra face se alguém ainda quiser bater, agora é com vocês, eu já desabafei. Abraços a todas!!!

4 comentários:

Anônimo disse...

Menina, muita coisa pra falar. Primeiro: adorei esse lance de qualquer coisa pode ser terapêutica. Nós (do meio de DV) somos tão alienadas (ou loucas ou interesseiras) que incutimos essa máxima no nosso discurso e ela passa, as vezes, a ter mais importância que o fazer artístico ou a técnica em si. E ficamos fazendo festinhas meia-boca em homenagem a coitada da Deusa e cobrando preço de ouro. Urgh!
Segundo: "O consultório ainda é uma ótima solução para resolver frustrações". Concordo contigo em gênero, número e grau. Já disse tanto isso que até já cansei de dizer...
Terceiro: também queria ser uma lady, mas quando vejo, lá estou eu, falando e escrevendo mais do que a boca. Tem gente por aqui que anda torcendo o nariz pra mim por isso, mas não quero aderir a cultura de massa que a DV na Bahia está tendendo a se tornar. Daqui a uns dias a gente não vai mais saber a diferença entre um show do Psirico e um show de dança do ventre.

Samara L. disse...

Uia, hoje a mulher tava mesmo pra falar...rsrs
Concordo com tudo, só acho que a gente devia se encontrar muito mais - não fosse a vida, essa bandida, tão corrida...

Lucy Linck disse...

Palmas, Daiane! Post-desabafo excelente!
Assino embaixo! Também sou uma bailarina-balzaca que já passou por poucas e boas...
Como você, nunca produzi um show meu, porque acredito que não teria como fazê-lo como imagino...para mim, exemplo de show prfissional é o que a Michele Pletsch faz em Bento Gonçalves, aqui no RS (o Al Nur é imperdível e totalmente espetacular). Também não me agrada muito essa visão da dança como terapia. Respeito quem pensa assim, mas não vejo a dança oriental árabe com esse fim.
Um abraço, e escreva mais, adorei tuas palavras!

Sahi disse...

Obrigada, meninas, demoro um pouquinho pra escrever e gosto muito, mais ainda, quando vejo que vocês leram e que não estou só em algumas idéias. Fiquem sempre à vontade pra discutir, negar, apoiar, acrescentar, enfim, acho que temos uma responsabilidade maior com o conceito da dança em função de tudo que a ela dedicamos. E o dia que fizermos nosso show, não vai ser só pra parentada, temos que levar o pessoal que não conhece, oportunizá-los a ver a qualidade das nossas danças e da nossa história, no mínimo, conhecer de primeira mão o resultadao de tanto amor, dedicação e estudo. Pois se a primeira impressão é a que fica, é justificável o embaraço cultural em que a dança se inclui por aqui. Gracias, mujeres!